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Arca russa

O componente essencial da alma russa é a megalomania. Fazer um filme de 97 minutos sem nenhum corte é megalomania, assim como construir aquele palácio da cultura sobre um pântano enquanto o povo passava fome.

A megalomania nasce da da enormidade do espaço físico e da enormidade do frio? A grandiosidade do cenário inspira a idéia de um destino também grandioso?

2. Não é verdade que o filme não retrata o povo, como disseram alguns críticos. O narrador-câmera pode ser o povo. E toda aquela gente no baile pode muito bem ser o povo, no seu delírio megalômano, sonhando ser gente rica e poderosa.

3. O diretor copia um europeu (Hitchcock, o primeiro a tentar fazer um filme num só plano-sequência), assim como os artistas russos, cujas obras enfeitam o museu, copiavam os modelos europeus.

4. Arca pode ser a arca de Noé, ou uma caixa de guardados, ou a Arca da Aliança.

O museu navegante, levando embarcadas as memórias e a gente da Rússia, lembra a arca de Noé, e, nesse aspecto, o final é pessimista: não se vê lá fora nenhum Ararat onde aportar.

Lembra uma arca ou caixa de lembranças, sendo essa a acepção mais óbvia do título, já que o museu não é outra coisa. O saite oficial anuncia que o Hermitage guarda a memória da arte desde a idade da pedra até o Século XX.

Mas a arca da aliança é o signo menos óbvio e talvez mais adequado ao espírito do filme. Há a implícita aliança entre a Rússia e a grandiosidade do seu destino, a aliança injusta entre o povo que custeou a construção daquele inestimável tesouro artístico e os nobres que dele usufruíram, a aliança entre memória-história e a arte que dela dá testemunho, e enfim a aliança entre o cinema, como força expressiva, e o espectador que é transportado pela lente da câmera para um mundo que não conhecia.


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